Galeria
Artigos

Sentir ou Expressar? A cultura japonesa e as emoções - Honne e Tatemae

Texto Escrito pelos Psicólogos Marco Aurélio Mendes e Ana Cláudia Mendonça

 

 

As emoções e a cultura estão intrinsecamente ligadas. Apesar de ancoradas na biologia da nossa espécie, as emoções são emolduradas pelas relações sociais e pela cultura na qual estamos inseridos. Desta maneira, em algumas sociedades a expressão das emoções irá se apresentar de forma diferenciada. Em países orientais, emoções como a vergonha parecem ter um peso ainda maior que no ocidente. Observa-se essas diferenças, mesmo dentro de um país ou estado. Uma família religiosa, por exemplo, pode apresentar maior rigidez quanto à possibilidade dos filhos poderem expressar raiva em direção aos pais. Enfim, não é possível separar as emoções da cultura na qual ela se apresenta, devido ao caráter radicalmente social da nossa espécie.

Esta relação intrincada entre emoções e cultura, não seria diferente no Japão. A sociedade japonesa é regida por muitas regras de etiqueta e a expressão dos sentimentos também deve respeitar essas regras de convivência. Uma dessas regras é a de que o todo está acima da individualidade, ou seja, a quebra da harmonia social deve ser evitada mesmo que em detrimento da expressão daquilo que é sentido. É nesse contexto que se apresentam as expressões Tatemae (建前) - o que é esperado e Honne (本音) - o que é sentido.

Enquanto Honne seria o sentimento verdadeiro e mais autêntico do indivíduo, Tatemae se refere a forma como ele se apresenta e que, por sua vez, precisa estar de acordo com as regras sociais de educação e do bom convívio, em uma espécie de máscara dos verdadeiros sentimentos e pensamentos.

Apesar do objetivo de Tatemae ser a manutenção da harmonia social, da paz e do equilíbrio do grupo, o custo de não poder expressar o que se sente, ou seja, o ônus do sufocamento dos verdadeiros sentimentos (Honne), é muito alto.

Na cultura japonesa é de suma importância manter a paz e a harmonia, evitando conflitos (verbais ou físicos) a qualquer custo, o que gera uma grande pressão sobre as pessoas para manter as aparências e se encaixar nas cobranças sociais. Destacar-se em uma sociedade que preza pelo coletivo é visto de forma negativa e o cidadão que não consegue aceitar essa pressão acaba se isolando socialmente. A cultura japonesa tem um nome específico para descrever este comportamento de extremo isolamento social doméstico, que é chamado de hikikomori (引きこもり).  Quem fala sobre o que realmente sente, sem se importar com as consequencias, é tratado como praticante de Baka shōjiki (バカ正直) (verdade tola), alguém que fala aquilo que não poderia ser dito. Outra forma de lidar com essa falta de possibilidade de se abrir sobre seus sentimentos é aprender outro idioma e desabafar com gaijins (estrangeiros).

Pode ser difícil para ocidentais entenderem essas expressões, porém este entendimento é imprescindível para melhor compreender a forma como o povo japonês se relaciona e se expressa e evitar julgamentos equivocados quanto a uma possível frieza ou insensibilidade. Se pensarmos nos aspectos ligados as expressões japonesas, Honne e Tatemae percebe-se que eles podem ser muito importantes para a harmonia da sociedade, mas o custo de se guardar tantas emoções represadas pode ser muito alto e prejudicial para o indivíduo. Pensar na harmonia do grupo é fundamental e importante, mas não podemos nos perder de nós mesmos no meio do caminho e represar as nossas dores e sentimentos. Que a gente possa ficar atento a esta dificuldade de expressar e sentir, encontrando a forma e maneira que seja saudável para nós.



Artigos e Notícias
Newsletter
Cadastre-se, receba nossas novidades, dicas e notícias.
Nome:
E-mail:
Rua Engenheiro Enaldo Cravo Peixoto, 215 – Sala 310 – Tijuca – Rio de Janeiro
(21) 99230 7496 – contato@tfebrasil.com.br